Estava montando uma tabela comparativa entre o Saturno V T-124 e um gestor humano típico, e pedi a opinião de uma amiga sobre os itens da lista. Ela disse que ao colocar “gestor humano” passava a impressão de que daqui a pouco poderia colocar E.Ts. ou macacos. Então me lembrei de um artigo antigo no qual havia citado um fundo administrado por um chimpanzé e comentei sobre isso com ela, que se mostrou surpresa.
No artigo anterior em que tratei de um tema semelhante, o chimpanzé citado era outro e, ao que parece, há vários outros casos similares. Naquele caso, a crítica incidia exclusivamente sobre a análise técnica, mais precisamente sobre a análise gráfica. No entanto, há evidências de que as mesmas críticas se aplicariam igualmente bem à análise fundamentalista. Ambas não conseguem superar o índice a longo prazo, com a diferença que os analistas técnicos geralmente executam mais operações, por isso perdem mais com corretagens, spreads, emolumentos, custódia e liquidação.
No presente artigo, trataremos do teste realizado em Wall Street para verificar a validade de uma declaração do economista Burton Malkiel. De acordo com ele, um chimpanzé de olhos vendados teria mesma performance que a média dos gestores profissionais. Então o Wall Street Journal realizou um experimento para testar esta hipótese. Um relato um pouco mais detalhado pode ser lido aqui: http://www.automaticfinances.com/monkey-stock-picking/.
Ao final de 100 períodos de testes, os gestores profissionais venceram em 61% dos casos e perderam em 39% dos casos. Mas ao aprofundar um pouco mais a análise do resultado, verificou-se que a competição ocorreu num período de mercado em alta, e os gestores profissionais escolhiam ativos de maior volatilidade, portanto embora tivessem lucrado mais, também estavam expostos a um risco maior. O professor Bing Liang, da Case Western Reserve University, esclareceu que ajustando o mesmo nível de risco para o macaco e os gestores profissionais, o macaco teria vencido pela margem de 3,8%. Isso significa que se os gestores estivessem competindo num período de queda, eles teriam perdido para o macaco, ou se operassem num período “normal”, combinando altas e baixas na mesma proporção que acontecem a longo prazo, também teriam perdido para o macaco.
Isso significa que não importa usar alguma estratégia ou operar aleatoriamente? Não! Significa que a esmagadora maioria das estratégias, inclusive aquelas usadas por gestores de grandes bancos e grandes corretoras, quase todas não oferecem vantagem em comparação a operar aleatoriamente.
Existem 4 níveis em que se pode operar no Mercado: 1. Por meio de estratégias ineficientes. 2. Por meio de Buy & Hold. 3. Por meio de estratégias eficientes. 4. Por meio de estratégias eficientes e bem otimizadas.
Mais de 99,9999% dos fundos, bancos, corretoras, gestores profissionais e amadores estão nos grupos 1 e 2. Poucos entre os melhores do mundo ficam no nível 3 e apenas dois no mundo operam no nível 4.
O nível 2 consiste em não fazer quase nada. Apenas comprar o índice e segurar, equivalente a aplicar na poupança, porém com rentabilidade nominal um pouco maior do que na poupança a longo prazo em troca de aceitar o risco de poder passar alguns anos negativos a curto prazo. Neste nível se tem a mesma performance do índice, cerca de 5% ao ano nominal ou 1% ao ano real. Veja mais detalhes no artigo sobre quanto se ganha de fato com Buy & Hold.
No nível 1 se faz quase o mesmo que no nível 2, porém comprando e vendendo em vários momentos, o que resulta no pagamento de mais taxas e mais spreads, por isso implica performances piores do que simplesmente comprar o índice. Quase todos os grandes fundos profissionais estão neste nível.
No nível 3 estão os mais consagrados investidores das últimas décadas, como Buffett, Soros, Lynch e Kovner, que conseguem uma predominância substancial e consistente em comparação ao índice, sendo que os melhores entre eles conseguem performance média de 25% ao ano. Qualquer pessoa consegue 25% ao ano, por sorte, ou até mais de 100% ao ano, dependendo do tamanho da sorte. Mas a longo prazo, converge para uma performance média igual à do índice. Só os melhores do mundo conservam ganhos acima de 10% ao ano ao longo de várias décadas e com boa homogeneidade. A homogeneidade na performance indica o nível de precisão com que se pode tomar como referência os resultados anteriores para estimar os resultados futuros. Ganhos passados nunca são garantia de ganhos futuros, mas quanto mais uniformes forem os ganhos passados, mais estreita é a variabilidade no nível de ganhos em relação à curva de crescimento e mais precisamente se pode estimar os ganhos futuros. Com ganhos em torno de 20% ao ano, o fundo de Robert Pardo tem algumas características que poderiam enquadrá-lo neste grupo e algumas características do grupo 4. Ele utiliza estratégias otimizadas, porém as estratégias não são tão boas nem tão bem otimizadas. William Eckhardt e Jerry Parker também ficariam entre os níveis 3 e 4.
No nível 4 estão exclusivamente o fundo Renaissance Technologies e o sistema Saturno V, ambos com performances acima de 50% ao ano. O fundo de Simons existe desde 1982 e acumula ganhos consistentes em torno de 72% ao ano. Depois de descontar as taxas de performance de 44% e taxa de administração de 5%, resta para os investidores o lucro líquido de 35% ao ano. O Saturno V 6.0 e posteriores estão operando em contas reais desde 2010, com média anual de 50,56%. Nas contas reais foram utilizadas as versões 6, 7, 8, 9, 10 e T-100. Nos próximos anos estarão em operação as versões posteriores à T-100, portanto com performances um pouco maiores que das versões mais antigas, com risco um pouco menor e resultados mais homogêneos. A versão T-124 está obtendo cerca de 77% ao ano entre 1986 e 2014.
Portanto, com um mercado em alta, os chimpazés ganham quase tanto quanto a média dos profissionais de Wall Street, e num mercado em baixa, os profissionais perdem mais que os macacos. Em média, considerando altas e baixas, rentabilidade e risco, o macaco se mostrou um pouco superior aos gestores profissionais de Wall Street.
Um dos critérios mais simples que possibilita identificar uma estratégia verdadeiramente eficiente é se ela envolve operações de compras e vendas a descoberto. Se determinada estratégia só pode ser aplicada em mercados em alta, ela não serva para nada e poderia ser substituída pelo puro e simples Buy & Hold do índice, ou poderia comprar um macaco e alimentá-lo com banadas, em vez de pagar taxas de performance para gestores.
Segue uma lista um pouco mais completa e detalhada com critérios que permitem identificar uma estratégia eficiente por meio de backtest: 1. A série histórica precisa ser tick-by-tick ou a estratégia precisa ter propriedades específicas que impliquem resultados muito semelhantes em séries de ticks e séries minuto a minuto. 2. A qualidade da série histórica precisa ser adequada, com mínimo de ruídos. 3. Deve-se configurar as condições iguais às do broker, no que diz respeito a spread, commission, swaps, slippage e delay. 4. A otimização precisa ser feita numa parte do histórico e a confirmação numa parte diferente. 5. A confirmação precisa ser num período de pelo menos 5 anos. Se a estratégia envolver exclusivamente operações de compra, então é necessário pelo menos 20 anos de histórico, com pelo menos alguns cenários de alta, baixa e lateral. 6. O número de operações na confirmação precisa ser de pelo menos algumas centenas. 7. A homogeneidade estacionária histórica precisa ter alfa de Cronbach de pelo menos 0,7. 8. Precisa haver similaridade no balanço e no máximo drawdown de pelo menos 0,8 entre situação real e backtest, durante pelo menos 3 meses.
Com estas 8 condições atendidas, se pode ter uma segurança muito alta de que os resultados obtidos nos backtests sejam representativos do que se pode esperar em situação real.
Se a finalidade for avaliar a qualidade de um fundo ou de uma estratégia que esteja sendo aplicada em situação real, bastam os itens 6 e 7 e a parte do item 5 que determina um período mínimo de 5 anos (se houver compras e vendas) ou 20 anos se houver exclusivamente compras.
Com base nestes critérios, para que a estratégia atenda às condições mínimas aceitáveis, ela precisa ser comparada ao índice (DJI, S&P500 ou Ibov) nos seguintes quesitos: • Proporção entre lucro anual médio e máximo drawdown. • Índice de Sharpe.
Se os resultados da estratégia superarem o índice nestes dois quesitos, então é provável que seja uma boa estratégia. Caso contrário, compre um macaco.